13.8.16

Porque sou um mau presbiteriano: O cisco e a trave no olho


Porque sou um mau presbiteriano: O cisco e a trave no olho

Eu não sou quem eu gostaria de ser;
eu não sou quem eu poderia ser, ainda,
eu não sou quem eu deveria ser. Mas graças a Deus
eu não sou mais quem eu era!
(Atribuído) Martin Luther King

Faça a pergunta certa

Não vou começar o texto citando um teólogo, citarei um político que disse: “Não pergunte o que seu país pode fazer por você. Pergunte o que você pode fazer por seu país”. Esta frase foi pronunciada por John F. Kennedy, presidente dos EUA. Fazendo uma adaptação, pergunte-se: “Não pergunte o que a minha igreja pode fazer por mim, mas o que posso fazer por ela?” Ou ainda, “o que posso fazer por mim mesmo para me tornar um cristão melhor?”.

Não raras vezes sabemos mais criticar uma igreja ou sua liderança e não temos o menor trabalho de fazer uma autocrítica construtiva e realística sobre si mesmo. A velha história do “cisco e a trave” da passagem do Novo Testamento em Mateus 7. A analogia utilizada aqui é: “quem julga vê um pequeno objeto nos olhos de outrem quando tem uma grande trave de madeira no próprio olho”. É muito mais fácil apontar os erros dos outros.

A igreja é uma sociedade de pessoas, e onde há gente há problemas. E por ser uma sociedade cada membro possui características individuais, somente suas, que o diferencia dos outros membros. Cada membro tem sua história, cada um tem sua personalidade, inteligência, sentimentos, talentos etc. E nesta mistura de gente, muitos acham mais fácil apontar os erros dos outros e não enxergar os próprios erros. O simples ato de jogar papel no chão na rua ou usar um celular enquanto dirige já me coloca como um mau cidadão. Quantas vezes desrespeitei o direito do meu próximo no trânsito da cidade ou numa fila de banco? Quantas vezes enganei, menti e prejudiquei alguém na família, no trabalho, na escola, na igreja, pelas Redes Sociais? Ok, tudo bem, não vivo subornando e sonegando impostos, não mato, não roubo! O que um mau cidadão tem a ver com a igreja?


Mea culpa

Viver somente a criticar a igreja a qual faz parte é ser como um típico cidadão que faz parte de uma sociedade, em parte corrupta, sendo participante de algum aspecto dessa corrupção, e ainda vive reclamando da corrupção. É o clássico problema da vitimização e egoísmo. Assim como o cidadão-eleitor vocifera contra os políticos que ele mesmo elege e esquece de que muitas vezes ele mesmo é um transgressor da lei. A igreja muitas vezes se encontra em situação deplorável e decadente, e não conseguimos detectar nossa parcela de culpa.


Tu és!

Deus permita que levante profetas como Natã para nos revelar os nossos pecados ocultos, como fez com Davi. -- O texto de 2 Samuel 11.26-27 e 12.1-15 . – “Tu és o homem!”, Davi quebrou todos os mandamentos possíveis, com um agravante, não confessou seus pecados e nem se arrependeu por um tempo. O contexto revela o pecado oculto de Davi. Muitas vezes estamos como Davi, cegos em transgressão. Seja como cidadão da terra ou do céu!

Como igreja devemos nos perguntar quais são nossos pecados ocultos e orar para que Deus nos revele. Você já se perguntou, quantas vezes já deixou de orar pelo ministério do seu pastor e liderança? Quantas vezes oramos pelos membros afastados da igreja ou pelo menos nos preocupamos em fazer um contato com esses irmãos?

Quantas vezes nas Redes Sociais somos arrogantes e pavio curto? Quando deveríamos ser pacientes, pedir sabedoria e buscar a paz. Quais são os dons que Deus me deu e não estou usando nem honrando a sua glória?

Quantas vezes por causa de algum ministério ou talento nos sentimos como superiores aos outros, cheio de vaidade? Enquanto a Palavra ensina: Pois, quem torna você diferente de qualquer outra pessoa? O que você tem que não tenha recebido? E se o recebeu, por que se orgulha, como se assim não fosse? 1 Coríntios 4:7 (NVI).

Somos peritos em falar mais em direitos, sempre queremos adquirir, ganhar, receber. Mas irmão, irmã, nosso coração está onde está nosso tesouro. – “Pois onde estiver o seu tesouro, ali também estará o seu coração". Lucas 12:34.


Meus direitos

Alguém já disse politicamente que somos uma sociedade fraca, queremos só os direitos e muita liberdade, mas deixamos de lado a responsabilidade e deveres. Na igreja somos também esse mau cidadão, queremos as bênçãos, mas não a santificação, a cruz. A igreja vai mal? Em grande parte somos todos cúmplices dessa situação. A missão dada a igreja envolve uma grande responsabilidade, aí de mim se não pregar o Evangelho! Mas mesmo com tantas oportunidades de compartilhar do Evangelho, me calo, silencio, fico omisso. Meu comodismo em missões e evangelização me torna um mau presbiteriano.

O que dizer da minha fraca comunhão? Encontro muito pouco meus irmãos e quando os encontro parecemos caçadores de algo para criticar. Muitas vezes gostamos de encobrir uma verdade, mentir, omitir, caluniar, como lavar as próprias manchas nas manchas do próximo. Isto não é comunhão! Um conselho para mim mesmo: reflita sobre si!


A serpente a pomba

A Palavra de Deus nos ensina a ter a astúcia da serpente e a simplicidade da pomba, mas muitas vezes somos só serpentes. Quem dera saibamos usar a sagacidade da serpente para escapar das armadilhas que colocamos para nós mesmo! Sejamos uma mistura de serpente e de pomba. Sejamos reflexivos dos próprios erros.


Herança, tesouro, legado

Como posso ser um presbiteriano melhor? Reconheço que nem todo presbiteriano é familiarizado com o conteúdo de sua confissão de fé, mas todos deveriam pelo menos reconhecer a importância da história da sua igreja. Muitos tiveram um contato mínimo com os símbolos de fé e história da igreja. Simplesmente vivem como ignorantes da herança protestante, dos tesouros doutrinários e legado histórico. Se você acha isso sem importância melhor seria que deixasse a igreja.

O que podemos fazer para melhorar esse quadro e oferecer a futura geração dos filhos da aliança uma igreja melhor? Devemos, HOJE, abraçar, amar, cuidar, estudar, ensinar e interpretar nossa herança reformada! Não há outro caminho! Necessitamos transmitir os ensinamentos confessionais de geração em geração.

O mesmo Jesus que disse "vai a tua fé te salvou" é o mesmo que diz para amar a doutrina e defender ou morrer por ela. A igreja é um lugar para pecadores, mas não para continuarem sem arrependimento e mudança de vida. Qual a sociedade que não há leis e princípios a seguir? Muito mais a sociedade projetada por Deus, que é a Igreja.


Construa cercas

Muitas igrejas presbiterianas não ligam muito para preservar e transmitir essa herança, mas ao invés de criticar e não fazer nada, senão murmurar, devemos construir cercas em torno delas. Cercas? Não seriam pontes? Não! Devemos construir cercas. Como se preserva uma plantação? Como se preserva uma mensagem? Como salvaguardar os ensinamentos? Como preservar na prática?


Símbolos de fé VIVOS

Um bom começo de nossa caminhada é seguir os símbolos de fé, examinar seus ensinos, ir às raízes, e de tanto analisar torná-los vivos, atraentes e pertinentes à vida cristã. Existe um conceito óbvio, básico, na agricultura que é aplicável ao estudante: quando a gente cava mais fundo a terra encontramos o final das raízes. Dentro da linha do tempo da história da igreja encontraremos comentários raros, clássicos, credos e confissões. Você pode está se perguntando: E a Bíblia? Somente ela não basta? O que posso lhe responder é que assim como um embrião é a essência de um ser humano, os credos e confissões derivam das Escrituras, enaltecem-na e não a anulam. Precisamos de aprimoramento e aperfeiçoamento, e a chave para a sobrevivência presbiteriana é voltar aos princípios. Falando em Bíblia, você já leu toda a Bíblia? Você se compromete em continuamente estudar a Escritura Sagrada? Percebe a trave no olho? Defendemos a Bíblia, menosprezamos o árduo trabalho das gerações passadas, mas não lemos a Bíblia continuamente.

Você como presbiteriano conhece os Padrões de Westminster (Confissão de Fé e Catecismos de Westminster)? Você se compromete de continuamente ler literatura de fé reformada para o seu amadurecimento cristão? Você se compromete em abandonar toda crença e prática que contrarie o claro ensino da Escritura Sagrada? Quantos livros doutrinários você leu desde a sua conversão?

Por que precisamos enfatizar a importância dos credos e confissões? Uma das respostas é que a Bíblia não segue uma cronologia exata. As mais excelentes confissões de fé reformada são um resumo de séculos de estudos e defesa da fé, elas nos entregam os ensinos mastigados. E também porque elas falam na linguagem humana e é possível extrair delas análise metódica, comentários aprofundados, tendo a Bíblia como o texto mestre. Os mais excelentes credos e confissões tradicionalmente usados através dos séculos já fizeram o trabalho de abrir as rodovias para andarmos. Nossa fé tem raízes, cave e encontre-a. A fé histórica nos une as muitas gerações anteriores. Nossa identidade está aí. Uma confissão bem fundamentada e sólida é como a pele para o nosso corpo, ela nos protege de invasores infecciosos, sem ela seríamos criaturas monstruosas com a carne exposta.



Perguntas fundamentais

Muitas perguntas aqui já foram formuladas por pastores presbiterianos, e o que se apresenta é extraído de boas perguntas de um artigo* publicado na página Bereianos.

Você como presbiteriano sabe como e porque a nossa igreja se organiza como igreja, o que você sabe sobre os presbíteros além de saber que eles sentam numas cadeiras bonitas? O que você sabe sobre governo eclesiástico? Será o sistema presbiteriano bíblico? Quando somos rebeldes a disciplina, a exortação e ao governo dos presbíteros o que estamos fazendo realmente? O dizimo é bíblico? Como a igreja se sustenta? São muitas perguntas importantes que são derivadas de uma boa compreensão de um sistema de doutrinas.

Ser apenas um presbiteriano no rol de membros não faz de você um presbiteriano de fato, assim como dormir numa garagem não fará de você um carro. Não despreze as raízes, são elas que trarão seu alimento.



Comprometimento e envolvimento

Qual seu comprometimento com o crescimento da igreja? Como você se compromete com os trabalhos da igreja? Você está envolvido ou comprometido com a igreja? Já ouviu a estorinha do boi e da galinha no almoço, nesta questão de envolvimento e comprometimento? É mais ou menos assim: a galinha fornece o ovo e o boi se compromete até o pescoço, literalmente. O boi se compromete dando sua vida para o almoço, a galinha apenas se envolve fornecendo seus ovos.

Você está convencido de que diariamente deve separar um tempo para orar e meditar na Palavra de Deus? Você está ciente da necessidade de realizar o culto doméstico com regularidade? Você tem ideia do que seja princípio regulador do culto?  Você crê ser necessário guardar diligentemente o Dia do Senhor? Você se compromete em não deixar de congregar nas reuniões e nos cultos públicos? Você entende que o culto solene não deve ter danças, coreografias e teatro? Você entende que é desprezível o uso de imagens, quer pinturas ou esculturas, no culto ao Senhor?

Como você se comporta em casa, na rua, no trabalho ou em outras atividades comuns? Como um cristão em todos os lugares? Os seus amigos e conhecidos sabem que você é um cristão? Você se COMPROMETE, se necessário, abrir as portas de sua casa para a implantação de uma nova congregação? Você ora para que Deus te dê discernimento de que pessoas Ele quer que você evangelize? Você está comprometido com a grande comissão de Cristo: fazer discípulos? Você está decidido a viver o evangelho em suas conversações, pensamentos e atitudes? Você está disposto a auxiliar os pobres e necessitados, com discernimento, quando for possível e realmente necessário? Você sabe que deve usar com moderação e sem desperdício os bens e o sustento que Deus te dá, de modo a não se tornar inadimplente? Você entende que a sua roupa não pode associá-lo ao desequilíbrio, falta de modéstia, ou a sensualidade, de modo a provocar desejos lascivos, ou escandalizando o próximo?

Há muitas outras questões que envolvem sua conversão, sua vida cristã, questões familiares, testemunhos públicos, questões de culto e doutrinas, e toda sua vida. Mas é suficiente apenas questionar algumas para expor nossa fragilidade.



 Impotência da comunidade cristã

Rousas John Rushdoony em 1997 já dizia: "Um fato terrível que nos ameaça hoje é a impotência da comunidade cristã. Mais da metade das pessoas nos Estados Unidos maiores de 18 anos confessam crer em Jesus Cristo como Deus encarnado, e na Bíblia como a Palavra infalível de Deus. Se essas pessoas fossem apenas ¼ da população, elas ainda deveriam dominar a cultura, quando na realidade é marginal. "



 Vamos olhar para o nosso umbigo

“A Igreja Presbiteriana do Brasil (IPB) é uma federação de igrejas que têm em comum uma história, uma forma de governo, uma teologia, bem como um padrão de culto e de vida comunitária. Historicamente, a IPB pertence à família das igrejas reformadas ao redor do mundo, tendo surgido no Brasil em 1859, como fruto do trabalho missionário da Igreja Presbiteriana dos Estados Unidos. Suas origens mais remotas encontram-se nas reformas protestantes suíça e escocesa, no século 16, lideradas por personagens como Ulrico Zuínglio, João Calvino e João Knox. O nome “igreja presbiteriana” vem da maneira como a igreja é administrada, ou seja, através de “presbíteros” eleitos democraticamente pelas comunidades locais. Essas comunidades são governadas por um “conselho” de presbíteros e estes oficiais também integram os concílios superiores da igreja, que são os presbitérios, os sínodos e o Supremo Concílio. Os presbíteros são de dois tipos: regentes (que governam) e docentes (que ensinam); estes últimos são os pastores. Em 2005, a Igreja Presbiteriana do Brasil tinha aproximadamente 4.800 igrejas locais e congregações, 263 presbitérios, 64 sínodos, 3.800 pastores, 415.500 membros comungantes e 125.000 membros não-comungantes (menores), estando presente em todos os estados da federação”. -- O que é a Igreja Presbiteriana do Brasil? Por Alderi Souza de Matos, historiador da IPB.

Meio milhão de presbiterianos. Quantos estão comprometidos e não simplesmente envolvidos com essa herança reformada? Podemos no mínimo sentir vergonha e tristeza de não conhecermos mais seus ensinamentos e história, mas isso não deve ser motivo para desespero.



 Faça algo corajoso

Temos que exercer um ESFORÇO consciente para impedir que a riqueza doutrinária da igreja se torne obsoleta ou irrelevante. Para isto se faz necessário estudar mais, analisar e investigar mais as boas literaturas e os mais excelentes comentários teológicos da herança reformada e PRODUZIR, REPLICAR, ENSINAR, TRANSMITIR. É assim que o povo judeu faz com a Torá para preservar suas raízes. Não há atalho, dedique-se ao estudo para investigar e ensinar suas doutrinas. Não é preciso ser um especialista para começar. Somos porta-vozes. Há muitas veredas já rastreadas e não precisamos criar novas trilhas, é mais seguro andar em caminhos já marcados. E nossos pais na fé já fizeram isso, sigamos suas pegadas. Mas é preciso esforço, ação. Como os antigos reformadores diziam: Façam algo corajoso por amor a Deus! Faça algo corajoso, não espere pelos outros! Quem desiste da verdade nunca a amou! Pare de caçar os erros de sua igreja, faça algo construtivo e edificante, sem espírito de rancor ou vingança. Faça para a glória de Deus. Peça a Deus orientação, sabedoria e ação. Faça! Se ninguém mais fizer, faça só.


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Texto: Raniere Menezes/Frases Protestantes (texto sem revisão)

*Artigo: Por que devemos ser zelosos no exame de candidatos a membros? -- Autor: Rev. Ewerton B. Tokashiki  - Fonte: Estudantes de Teologia – Link: http://bereianos.blogspot.com.br/2016/01/por-que-devemos-ser-zelosos-no-exame-de_20.html

Imagem do título: O Cisco e a Trave 1619. Por Domenico Fetti, atualmente no Metropolitan Museum of Art, em Nova Iorque.

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